quarta-feira, janeiro 17, 2007

Recaída

Bom, não sei como começar a escrever sobre tudo o que aconteceu nesses meses. É triste saber que você pode ficar a mercê de algo que foge totalmente a seu controle.

Resumidamente: não me segurei mais do que alguns dias após o último post. Entrei em sites de jogos rápidos e baixei alguns. Como faz muito tempo não me lembro se passei duas, quatro ou seis horas jogando, ou se joguei um, dois ou três dias nas semanas seguintes. Mas voltei a jogar, e uma vez que você volta, uma vez que você entra de novo no universo da satisfação imediata, você pára de pensar racionalmente.

A primeira vez que você volta a jogar, você é engolido pelo ambiente do jogo, mesmo que seja bastante tosco. Já passei algumas vezes horas jogando Campo Minado, do windows, ou mesmo pinball, que é um pouco mais elaborado. Tudo o que você quer fazer é terminar fase após fase após fase, cada vez ficando mais expert nas dificuldades daquele jogo, alcançando níveis de excelência e recebendo um grande "PARABÉNS" por ter conseguido, com uma satisfação interna por ter passado de mais essa fase. Vencer o jogo é extremamente gratificante. E isso te leva a ir atrás do próximo jogo assim que você termina esse. Se não hoje, quem sabe amanhã ou depois, quando você correr com as responsabilidades do trabalho e ganhar alguma tempo "livre".

Tive vários períodos de semanas de abstinência intercalados com períodos de dias de jogo. O trabalho progrediu muito, pois passava grande parte do tempo trabalhando alucinadamente, e aliviando a tensão com jogos. Sempre jogos bobos, sempre jogos que com algumas boas horas você termina e não vê mais porquê jogar. Acho que essa foi a maneira de me poupar, mesmo que inconscientemente, de algo pior. Escolhi jogos que tinham um fim, que uma hora acabavam e pronto, ao invés de jogos que exigissem meses de dedicação.

O grande problema é que com a grande quantidade de jogos como esse disponíveis por aí, baixar três e jogá-los por uma semana acabavam comendo um bom naco do tempo de trabalho. Por muita sorte eu sei trabalhar sob pressão e consigo acelerar nos momentos cruciais, e essa era mais uma grande desculpa para não me sentir mal pelo jogo. Afinal de contas se eu puder aliviar o stress do trabalho com um parzinho de horas de jogo a cada dois dias, o que há de ser tão ruim assim? Se isso me ajudar a produzir ainda mais, melhor ainda.

O grande problema é que não funciona assim. Aprendi faz pouco tempo que o problema é progressivo. Você controla durante dias, meses, e até anos. Posso dizer que, perto do perigo que o jogo compulsivo representa, eu estive longe de qualquer problema por anos, desde que eu comecei a trabalhar até o fim do ano passado. Jogar por entretenimento é possível para um compulsivo, mas mesmo que demore muito, deixa de ser entretenimento e se torna compulsão; assim, logicamente, jogar por entretenimento não é possível para um jogador compulssivo, pois o tempo em que se encara como diversão é sempre limitado, levando inevitavelmente ao descontrole.

Um bom exemplo? Eu de novo. Aproximadamente a partir de novembro eu perdi o controle de novo, e isso ficou bastante claro em dezembro e janeiro. Com a chegada de um computador mais potente em casa, vindo dos meus sogros, a porta estava aberta para eu instalar os tipos de jogo em que eu estava me refugiando. Jogos simples, com começo, meio e fim, e principalmente que não envolvessem interação com outros jogadores online. Sempre dizendo para mim mesmo que não estava com problemas de vício e que era só pra aliviar a tensão do trabalho, dinheiro, etc. Só que junto com estes jogos que já me estavam viciando novamente, jogava também o poker.

Talvez o meu grande erro foi instalar jogos de poker online, embora eu ache que mesmo sem isso o caminho teria sido parecido. Isso é tudo o que eu não devia nem ter pensado em fazer. Jogar contra jogadores reais me traz a competitividade à tona, me faz ficar sonhando em relação a ser reconhecido num pequeno universo e como seria possível um dia vir a ganhar dinheiro com isso, me traz a vontade de ficar bom, bom de verdade, e ganhar "A" grande bolada da vida. Nessa hora estávamos em dificuldades financeiras, e eu tive certeza de que a maneira perfeita de sair dos problemas era começar a treinar e aprender muito sobre o poker, quando me sentisse bem preparado colocar um pouco de dinheiro real, e fazê-lo multiplicar por muitas centenas. Colocar 50 dólares e sair com 10 mil. Tudo muito fácil de se fazer e sem chance de erro. Cheguei até a ganhar um total de 8 dólares jogando torneios em que não se pagava nada para entrar. TODOS os problemas resolvidos, YUHUUUU ... Não sei exatamente o que acontece com o cérebro nesses momentos de euforia com sonhos utópicos, mas certamente pensar racionalmente é algo que passa longe.

Comecei a ficar ansioso com a chegada da hora de dormir para atrasar um pouco a ida para a cama, e dividir o tempo entre navegar um pouco nas internet, matar vírus no computador, procurar material para estudar, jogar, jogar e jogar. Meio a meio entre tarefas úteis e o jogo, talvez mais o jogo do que outras coisas, mas sempre tentando me segurar. De dez da noite até uma da manhã, de onze da noite até duas, de dez até duas e meia. Tudo com a desculpa de estar treinando poker, ou de estar me distraindo do stress do trabalho, e que quando tudo passasse, eu pararia sem problemas. Até aí não parece nada, mas escolher ficar no computador jogando e mexendo por aí, ao invés de estar dormindo abraçado com a minha esposa é algo impensável. E esconder dela que estou fora de controle, é mais impensável ainda.

Isso aconteceu algumas vezes em janeiro, pois me segurei até lá; talvez uma ou duas em dezembro, já não consigo me lembrar, mas acontecer uma única vez já é grave demais, pois mostra que a única coisa que me manteve afastado durante quase 4 anos estava começando a ser afogadada pelo maldito vício, minha esposa. Isso eu não suporto, isso eu não posso permitir e isso não vai acontecer. É a grande felicidade da minha vida, é a certeza de ser feliz para sempre, e isso não pode ser colocado em risco. Eu faço literalmente qualquer coisa para vê-la feliz, e ir contra isso é ir contra tudo o que eu acredito e prezo nessa vida.

O grande problema é a aceitação. Eu ainda não consigo aceitar meu vício. Eu SEI que eu sou viciado, mas não consigo me SENTIR um viciado irremediável. O próprio consenso da sociedade em relação aos jogos de computador é de que é puro entretenimento, e passar muito tempo jogando é pura safadeza, falta do que fazer ou imaturidade. Colocar em risco um casamento, um não, "O" casamento não é pura safadeza. Um trabalho que me suga 50 horas por semana e uma casa com cachorros pra cuidar, fora o tempo de lazer com a esposa não é falta do que fazer. E imaturidade ... bom, como não consigo aceitar meu vício, e como todos somos frutos do que a sociedade nos ensina, sobra só a imaturidade. Talvez quando eu conseguir aceitar o vício como um problema sério, uma doença incurável, eu me sinta mais maduro, mas por enquanto não.

Tenho certeza de que quando eu conseguir aceitar o vício em jogos de computador como uma doença grave, algo incurável, algo que pode apenas ser controlado um dia após o outro, eu consiga de verdade ficar longe, por anos e anos. Até lá só consigo racionalizar e deduzir que se até hoje eu não consegui me manter longe, só pode ser sério. Se mesmo tendo aprendido várias coisas a respeito da compulsão, e mesmo assim ela ainda me atinge e me faz perder o senso da realidade, responsabilidade, me faz me tornar outra pessoa, irreconhecível, então isso precisa ser tratado.

Hoje só tenha a agradecer por ter conhecido minha esposa. Todos os dias em que o vício batia mais forte, sabia que a única coisa que ia me fazer parar naquele dia era a vontade de ir pra casa e ficar com ela. Isso é mais forte que tudo, e me fez parar os jogos mais excitantes possíveis, desligar tudo e ir encontrá-la onde quer que tivéssemos combinado. Não sei se o mesmo aconteceria com os jogos multiplayer online que jogava no passado, e com certeza não vou pensar nisso, ou chegar perto. Só tenho certeza que se não existisse ela na minha vida, hoje eu estaria sem emprego, e sabe-se mais lá em que situação em decorrência de 12 horas de jogo por dia, 7 dias por semana, como foram vários anos da minha vida.

Este vício tem o poder de te fazer esquecer de tudo enquanto você está jogando e, em casos cada vez menos raros, até de comer ou se movimentar um pouco, causando problemas físicos. É possível morrer em decorrência desse vício. A doença é grave, é uma variação do clássico vício em jogos de azar e à dinheiro, e deve ser tratada como tal.

1 Comentários:

Às janeiro 18, 2007 1:23 PM , Anonymous Anônimo disse...

Bruno;

AJUDA PARA PARAR E MANTER-SE PARADO:

Ainda não li todo seu blog, mas vejo que você está com problemas devido à adicção ao jogo eletrônico. Em Jogadores Anônimos (www.jogadoresanonimos.org) estamos recebendo pedidos de ajuda de outras pessoas com o mesmo problema.

Creio que você e estas outras pessoas poderão se reunir em Jogadores Anônimos no sentido de abrir um grupo específico para dependentes de jogo eletrônico. ISSO LHE AJUDARÁ A MANTER-SE ABSTINENTE DO JOGO E EM PLENA RECUPERAÇÃO.

Já tentamos abrir um grupo específico para esta modalidade de adicção por jogo aqui no Rio, mas ainda não vingou.

Se desejar entrar em contato, escreva para: Ubiracy - e-mal: jaesb@jogadoresanonimos.org ou rezende3@yahoo.com.br

 

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