quarta-feira, dezembro 12, 2007

Mais histórias

Novamente posto histórias que foram colocadas nos comentários. Cada vez mais reportagens vão aparecendo e histórias vão sendo contadas a respeito do problema. Abaixo coloco as duas que me mandaram.

------------------------------------------
11 de Dezembro de 2007

Apesar de viver do outro lado do atlântico, o teu comentário é quase um espelho da minha vida. (Não tenho pesadelos, mas sonho com jogos quando paro de jogar, estes sonhos misturam-se com cenas quotidianas). Ignoro problemas, deixo coisas importantes para depois (que antes seria impensável), por vezes ignoro a minha noiva sem querer. Desisto facilmente para o jogo quando aparece um problema... que antes resolvia num piscar de olhos.

Tenho também um futuro cunhado 9 anos mais novo com 19 que não é capaz de parar de jogar um jogo chamado Tibia, ele passou um ano e meio nesse jogo, e os pais dele ainda não tomaram a consciência devida ao problema. Eu pelo menos tenho uma vasta experiência na minha área, mas ele nada :(.

Eu estou num doutoramento (irónico, porque está em águas mortas agora). Há uma capacidade de concentração que perdi há uns anos quando houve um intervalo longo na minha vida após a graduação, tenho tido um apoio muito forte da minha noiva, as recaídas acontecem facilmente assim que se perde algum controlo. Tento distrair-me com outras coisas, mas facilmente caio na teia novamente.

------------------------------------------
12 de Dezembro de 2007

Oi! Também encontrei seu blog pelo artigo da revista Época. Eu estava procurando notícias sobre esse novo vício porque minha vó tem tido comportamentos estranhos e até então não sabia identificar.

Pois é, pra quem achava que isso era coisa de jovens, não é. Minha vó comprou um computador há alguns meses e me pediu para ensiná-la com algumas coisas. Pois bem, ingressei ela no mundo digital, msn, bate-papo, jogos online e comunidades tipo orkut. Me espantou como ela pegou a "manha" rápido. Acho que por causa da idade dela não se interessou em jogos mirabolantes, mas comecei a perceber que quando ela não tinha amigos online ela se limitava a jogar paciência. Para vc ter uma noção, entro no meu trabalho às 9hs da manhã e saio às 18hs e nesse período a minha vó sempre está online no messenger, fora o horário que eu volto pra casa. Já notei até algumas vezes em que ela diz boa noite, entra no quarto e assim que faço o mesmo ela volta ao escritório e retoma seu novo vício.

Cheguei a entender que isso não era normal quando numa queda da conexão a deixou extramente irritada e dizia que eu como "jovem entendida" deveria consertar. Na hora disse que eu estava ocupada e ela começou a resmungar. Quando a internet voltou, senti como se ela tivesse ficado embaraçada com a situação e até mesmo com vergonha por ter discutido por uma coisa tão pequena, mas não me disse nada.

Hoje ela participa de mais de 5 comunidades diferentes, entre sites de encontros ou tipo comunidades como o orkut.Percebo também que ela esquece de comer algumas vezes ou leva o prato até o computador, até a novela das 8 perdeu a vez.

Ainda não encontrei um modo de dizer isso a ela. Ontem mesmo ela deixou de fazer alguns afazeres domésticos e chegou a deixar comida no forno passar do ponto. Mas como dizer isso a avó? Uma aposentada que aparentemente encontrou um mundo novo e "antenado". No dias atuais, idosos não têm muitas opções de lazer e mesmo sabendo que a internet está prejudicando sua vida, é difícil fazê-la abandonar um vício que está "completando" seu dia.

------------------------------------------

Sempre é difícil para mim ler outras histórias sobre vício em jogo, vício em internet mas paralelamente fico feliz que pessoas próximas ou mesmo a própria pessoa que está enfrentando o problema estão tentando e conseguindo saber mais sobre o problema por reportagens ou blogs.

Quando você está na faculdade (ou pós graduação) acontecem muitas mudanças na sua vida. No meu caso eu acabei recebendo uma liberdade instantânea por ir morar fora de casa, e isso me deixou perdido. Aquilo que eu mais desejava na época acabou ajudando a me fazer perder o norte. Além disso veio a pressão por resultados nas provas, novas amizades, festas, o que fazer quando eu me formar, e um tanto de auto-sabotagem (mas isso já é outra história), etc. Eu precisava escapar de algum jeito, senão ia explodir.

O que eu mais aprendi a respeito desse vício, e que vou levar comigo para o resto da vida, é que é mais fácil você esconder os problemas e dificuldades do que enfrentá-los. É muito mais fácil fingir que nada de ruim está acontecendo, e passar o tempo todo fazendo coisas que dão prazer imediato. Você não resolve nada da sua vida e, no final do dia (ou quando você não aguenta mais), você está tão cansado que consegue dormir tranquilamente, o que não seria possível se estivesse pensando nos problemas diretamente. No dia seguinte você se sente culpado por não ter enfrentado os problemas, e isso faz mal, e novamente o refúgio é o jogo, a internet. No outro dia você se sente tão culpado de estar se escondendo por dias dos problemas que a primeira coisa que te passa pela cabeça quando acorda é jogar. A idéia de encarar tudo o que você perdeu e deixou de fazer dói tanto, que a única solução é continuar jogando. O ciclo é interminável, e só tem uma quebra quando alguma força externa age nele. Um parente que te dá um esporro, um semestre de faculdade jogado no lixo, a faculdade inteira jogada no lixo, o chefe que dá um ultimato, ou mesmo manda embora logo, o prazo que passa, o adiamento do prazo que também passa, sei lá, alguma coisa que nos faça acordar.

Nós não somos menos porque somos pessoas com problemas com este vício, nós estamos menos naquele momento em que deixamos o vício tomar conta. Somos exatamente a mesma pessoa quando estamos jogando sem parar ou quando estamos "sóbrios", mas gastamos toda nossa energia e emoções no mundo virtual ao invés de no mundo real. Nós apagamos e gastamos tudo o que há de melhor, tudo o que brilha em nós, no lugar errado. Mas basta ter força para sair, para quebrar o ciclo destrutivo de se esconder, e depois de uma "ressaca" podemos voltar ao normal. Essa é a hora mais difícil. Encarar tudo o que foi jogado fora, olhar o leite derramado, encarar a merda que você fez, pisou e sentou, e perceber que não importa tudo o que você fez, desde que a partir de agora você faça as coisas certas.

Sempre que leio parágrafos como esse acima me sinto como se tivesse lendo textos com chavões de auto-ajuda. Mas digo tudo com experiência própria. Quando você resolve encarar os problemas e - principalmente - compartilhar com pelo menos mais uma pessoa explicando a seriedade do que você está passando, tudo começa a parecer mais fácil. Encarar o problema é o primeiro passo; com isso você consegue quebrar o ciclo. O segundo passo é ter mais alguém junto com você para enfrentar tudo, senão fatalmente você voltará para o vício.

Se você conhece alguém que está passando por algo parecido, não force nada, não tente apontar o erro diretamente, não a julgue ou culpe por nada. A pessoa sabe que está fazendo algo errado, só não tem idéia de que isso possa estar afetando muito mais do que ela acha, e ficar apontando erros e defeitos só vai fazê-la se sentir pior e querer se esconder o mais rápido possível. Ela só vai encarar o problema quando tiver certeza que é um problema sério.

Como hoje existem muitas matérias, textos, etc que falam a respeito, o ideal (pelo menos o que funcionou comigo no começo) é mostrar alguns textos, tentar mostrar que existe algo que está acontecendo com cada vez mais gente, e que pode acabar com a vida de pessoa, ou no mínimo uma grande parte. Mostre que você está preocupado com ela, e não nervoso por o que ela estar fazendo ser errado. Tenho certeza que a mudança não é imediata. Ela não vai olhar pra você e dizer "nossa, você está certo, vou parar com isso". As campanhas anti-tabagistas esperam convencer as pessoas com informação, e não com opressão ou julgamento. Se existir a abertura para uma conversa mais franca, faça tudo menos "passar a mão na cabeça". O que a pessoa está fazendo é errado, e ela precisa mudar as atitudes, e vai ser difícil, e ela vai ser a maior responsável por continuar ou parar. Você oferece apoio para conversar, para que ela desabafe, dá conselhos, mas não pode nem dizer que a vida é assim mesmo, que ela é uma vítima, nem tentar proibí-la de jogar ou navegar.

Infelizmente somente a pessoa que está passando pelo problema poderá decidir se quer sair ou continuar. Quem está em volta pode oferecer a mão, o braço ou o corpo todo, mas se ela não agarrar por conta própria, não dá certo.

Como digo em quase todos os posts: só espero que cada vez mais informação a respeito surja e alcance o maior número possível de pessoas, pois esta é a única maneira de quem tem o vício poder combater em pé de igualdade.

6 Comentários:

Às dezembro 14, 2007 9:50 AM , Anonymous Anônimo disse...

Muito Obrigada!!! Foi de muito ajuda tudo que vc disse!!! E sorte a todos nós!!! Parabéns por esse espaço que me parece mais acolhedor do que "chavões de auto-ajuda"...
Beijos,
Lua

 
Às fevereiro 07, 2008 11:04 PM , Anonymous Anônimo disse...

Oi! hoje tambem tomei o primeiro passo para minha liberdade,sou compulsivo.boa sorte!companheiro.

 
Às novembro 18, 2008 11:21 PM , Anonymous Anônimo disse...

boa noite... acabei de ficar o dia todo na frente do computador jogando GTA...la pelas 19 horas foi dificil ir ao meu curso de teatro, acabei por não ir, e jogando mais...
Tenho cerca de cinco jogos no computador, dois MMORPG.
Me parece que o jeito é simplesmente parar dee jogar, mas este "simplesmente" me parecee dificel, é mais ou mesnos isso...

se quiserrem dizer alguma coisa pode mandar um e-mail, sktacio@yahoo.com.br aceito sugestoes... abraços

 
Às setembro 14, 2009 6:32 PM , Blogger Pablo Noronha disse...

Só para o pessoal saber um pouco mais sobre o trecho:
"Tenho também um futuro cunhado 9 anos mais novo com 19 que não é capaz de parar de jogar um jogo chamado Tibia, ele passou um ano e meio nesse jogo, e os pais dele ainda não tomaram a consciência devida ao problema."
Sim, esse jogo realmente vicia a pessoa de tal maneira que ela larga vida social e até profissional, digo isso por experiência própria, joguei durante 3 anos esse jogo, por vezes até chorava quando morria nele, graças a Deus já faz 4 anos que não jogo mais, e quero continuar assim, mas aqui fica um mistério, o que será que atrai tanto num jogo gráficamente simples e sem animações?
Deve existir várias mensagens subliminares, outra explicação não tem.

 
Às junho 06, 2011 4:00 PM , Blogger Maria Goretti disse...

Sou mãe de um viciado em tibia.Já tem 7 anos que estou na luta.Estou sem chão.Ele tem 19 anos ,largou a faculdade de eng. civil, estou dando a ultima chance com intercambio para o Canada.Eu sei que depende dele para largar o vicío e estou torcendo para isto.Não existe uma formula mágica depende dele.

 
Às novembro 23, 2011 6:15 PM , Anonymous Anônimo disse...

Acabei de encontrar esse blog por acaso. Estava me sentindo mal, depressivo, por não conseguir lidar com as situações mais cotidianas por causa do vício em jogos, e então pesquisei no google pra ver se existiriam outros com o mesmo problema. Nossa, o trecho sobre a dor de encarar tudo o que deixamos de viver por conta desse vício, que causa um ciclo vicioso que nos faz jogar cada vez mais, foi perfeito. Gastei minha adolescência inteira em frente ao video-game, sem namoradas nem amigos. Aos 16 anos tomei a forte resolução de vender meu playstation e abandonar o vício para estudar. Passei no vestibular, em seguida em vários concursos públicos, e comecei a desfrutar a vida pela primeira vez. Infelizmente, dez anos depois, voltei para o vício, e estou já há dois anos passando diversos problemas pessoais e profissionais por causa disso. Mas vou superar de novo, fé em Deus. EPJ

 

Postar um comentário

Assinar Postar comentários [Atom]

<< Página inicial